sexta-feira, 25 de março de 2011

Tribos juvenis urbanas


“Vivemos numa época decadente: os jovens já não respeitam seus pais; são grosseiros e impacientes. Passam o tempo nos bares e festas e não possuem qualquer domínio sobre si mesmos” (inscrição dum túmulo egípcio de 4 mil anos atrás).

Quarenta adolescentes de Paulista, cidade pernambucana, foram detidos por tomarem parte do assassinato com crueldade de outros três adolescentes. São integrantes da “galera do beisebol”. Os garotos mortos voltavam de uma festa com outros seis amigos, quando foram cercados pela numerosa gangue adversária. Sob a mira de um revólver foram obrigados a se deitar na quadra de uma escola. Aí foram espancados e quatro deles receberam tiros na cabeça à queima-roupa (Folha de São Paulo, 24/08/93).

Letícia é uma jovem psicóloga que trabalhava numa repartição pública. Lá tinha um colega que era médico, chefe de um posto de saúde. Depois de muita insistência Letícia aceitou o convite para jantar fora com ele num sábado à noite. Na volta, ele parou o carro num lugar deserto e propôs para subir para o apartamento dela e transarem sexualmente e até começarem a viver juntos. Como ela não aceitou, ele puxou o revólver, não aceitou os pedidos de clemência da moça e deu cinco tiros nela. Jogou o corpo na estrada e fugiu. Uma turma de motoqueiros estava se drogando ali por perto. Escutaram os tiros e foram ver. Encontraram a moça desfalecida, esvaindo-se em sangue. Levaram-na depressa para o Pronto Socorro. Lá foram detidos como suspeitos do crime. Sorte deles que os tiros não atingiram nenhuma parte vital e a moça conseguiu se recuperar e limpou a barra deles. Apesar da denúncia dela, o doutor nem foi indiciado e continua a ser “um homem de bem”, pessoa de muita responsabilidade.

Getúlio e Rogério são dois jovens que participam duma turma que se droga e costuma ser violenta. Getúlio ia mal no colégio e um professor o convidou para ajudar num curso de alfabetização de adultos numa favela e ele topou. Quando o professor vai visitar o curso, os adultos agradecem a ele pelo jovem alegre e atencioso que havia conseguido para auxiliá-los a aprender a ler e escrever. Rogério foi convidado para participar do “rebanhão” do grupo de jovens da paróquia no carnaval. Foi depois ajudado pelo PACTO (Pastoral de Apoio Comunitário ao Toxicômaco). Passou nove meses em recuperação numa fazenda especial. Ele diz que achou o Cristo e um sentido forte para a sua vida. Rogério agora está trabalhando e vivendo bem com sua família. Participa de reuniões com outros familiares de drogados. Dá seu testemunho em palestras para jovens.

O gosto de viver em grupo

Desde muitos séculos os jovens são considerados rebeldes, bagunceiros e de gostar de viver em turmas.
Quando crianças, os filhos são mais obedientes, carinhosos e caseiros. Ao entrar na adolescência, crescem e amadurecem sexualmente. Começam a se distanciar dos pais. Querem ser eles mesmos e não depender de ninguém. Ficam inseguros, agressivos e contraditórios. Na sua turma buscam refúgio e segurança. Nesta idade a pessoa precisa formar sua identidade dentro do seu tempo e imagina encontrar esta identificação forte no seu grupo. Está contente, seguro e protegido quando pode estar junto com seus amigos para conversar, jogar, se divertir e aprontar.
Tribos juvenis

Nas cidades, sobretudo nas grandes, os adolescentes e os jovens formam grupos mais ou menos conhecidos e até temidos quando violentos. São chamados de turmas, galeras, comandos, bandos. Os grupos mais agressivos são as famigeradas gangues ou quadrilhas que provocam confusões e arrastões e dominam regiões.

Como termo geral, a sociologia denomina estes grupos juvenis de tribos urbanas. A tribo é um conjunto de comunidades de descendência comum que falam a mesma língua e possuem costumes, tradições, normas, ritos e instituições comuns. É uma organização social bem antiga. Muitas escolas de samba se chamam de tribos.

Nas cidades grandes não é fácil manter boas relações de amizade. Mesmo a vizinhança tem pouca aproximação. O processo de tribalização ou de formar grupos de pessoas com interesses comuns é a maneira delas resistirem à despersonalização no meio das multidões e de estabelecerem relações de companheirismo.

As tribos juvenis urbanas podem ser maiores ou menores. Há jovens que participam sempre e outros de vez em quando. Há turmas que se reúnem nas esquinas e às vezes saem juntos. Os jovens buscam o encontro, o diferente, o proibido, uma identidade forte com emoções intensas. 
Eles se comunicam através de uma linguagem própria (gíria) e com gestos característicos.
O enfraquecimento das instituições sociais como a família, a escola e a religião aumentou a procura por estas tribos por parte dos jovens.

O impacto visual

Os jovens destes grupos gostam de causar impacto pelo visual e pelo barulho. Uns são carecas, outros cabeludos ou com topetes agressivos. Usam tatuagens e roupas exóticas. Uns são violentos e outros, como os góticos, são pacíficos. alguns são racistas e até nazistas. Uns usam drogas como ritual da turma, outros suportam o tóxico e alguns são contra (“cabeça limpa”). Os grafiteiros e os pichadores disputam espaços e os lances mais ousados. Valorizam o corpo e por isto, quem pode, freqüenta academias de desenvolvimento físico ou de artes marciais. São muito livres na questão de sexo; são mais de “ficar”, também porque muitas tribos são formadas quase exclusivamente por rapazes.

Aumenta o número de grupos místicos e esotéricos mas são de jovens que podem estudar e acompanhar esta nova tendência universal.

O rock de vários tipos é a música que desperta, levanta o astral e envolve multidões de jovens. Através da mídia, há uma retomada da música popular brasileira e das próprias de cada região.
A lealdade é um valor muito destacado por eles. Juntos, eles se sentem fortes e muitas vezes se tornam prepotentes e incomodam os vizinhos.

Os líderes geralmente são maiores de idade e se impõem pela força ou pela coragem. Eles dominam e exigem tarefas arriscadas e impõem castigos aos desobedientes. Muitos jovens que são rebeldes em casa, não hesitam em seguir ordens absurdas do chefe de sua gangue. Para serem aceitos na turma, os novatos passam por provas e praticam loucuras para se afirmar e chamar a atenção.

Violência e insegurança

A miséria e a marginalização sempre crescentes e a perda dos valores envolvem as nossas cidades na violência e na insegurança. A rua, além de ser o espaço de socialização nas periferias, passou a ser perigosa e de aprendizado do crime. As tribos urbanas participam desta realidade. Elas muitas vezes praticam violências e causam medo nas pessoas, mas não são as geradoras da violência. São também as vítimas. Os jovens da tribos, às vezes, fazem coisas surpreendentes como na história verídica contada no início. Entre si eles se ajudam e partilham o que têm. Mas se tornam violentos e destruidores quando consomem drogas ou entram em conflito com outras gangues. A polícia militar de São Paulo matou 1.470 pessoas em 1992, sendo muitos ainda jovens, e poucos a consideram violenta. Mas alguns meios de comunicação destacam só os deslizes dos jovens como se eles fossem os únicos violentos e todos participassem de gangues.

Desafio para todos

A Pastoral Urbana ainda é um desafio para a Igreja. Esses jovens vivem totalmente envolvidos pelas cidades com milhões de solicitações e apelos. Não podemos ficar parados ou esperando que eles venham até a Igreja. Como Jesus, o Bom pastor, temos que procurá-los, conhecê-los e acompanhá-los para que percebam o valor da família e da religião em suas vidas. Para levar a eles a mensagem de Jesus libertador precisamos saber como eles são, o que pensam, pelo que se interessam e vibram, quais os seus valores e como se comunicam.

A pastoral do menor procura promover as crianças, adolescentes e jovens mais abandonados. A pastoral da juventude é a organização dos grupos de jovens cristãos ligados à Igreja. Está promovendo também atividades de massa com celebrações, caminhadas, shows, festas. Há grupos de jovens cristãos do meio popular que atuam nas comunidades pobres onde vivem. Cultivam a amizade sincera, a alegria, a luta por melhores condições de vida juntamente com outras entidades populares.
QUESTÕES PARA DEBATE
1 - Como são os grupos, as tribos, as gangues dos jovens que você conhece?

2 - O que causa a violência na nossa sociedade? Por que os jovens participam desta violência?

3 - Como dar espaço para os jovens superarem seus problemas e participarem de grupos cristãos alegres e amigos, mas comprometidos com a sua comunidade?
José Rodolpho Hess.
Artigo publicado no mês de Novembro de 1993, páginas 6 e 7.


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