sexta-feira, 25 de março de 2011

Liturgia: brincar diante de Deus - Eliomar Ribeiro

 

Um escritor italiano, Romano Guardini, disse que a Liturgia “são os filhos e as filhas de Deus a brincar diante do Pai”. Celebrar como brincadeira de criança... já imaginou... lembra um pouco nossas festas populares, com muita música e conversa, luzes e cores, comida e bebida, abraços e beijos, algazarra e silêncio, presente e gratuidade. Confesso que quando li esta definição eu pensei logo dos meus tempos de criança, na roça, quando brincava com meus irmãos e primos de bola, de pique de esconder, de andar a cavalo num pedaço de madeira. Era a maior felicidade. Todas as tardes, após a brincadeira tomávamos banho e íamos comer a comida gostosa preparada pela mamãe. Um ritual comum, que sempre nos deixava plenamente felizes.


Quando a gente pensa nas nossas Celebrações, a maioria delas não são assim. É tudo tão sério, tão endurecido, tão estático, tão sem vida. No mês de julho, assessorando um grupo temático do Mutirão Brasileiro de Comunicação, alguém disse que nossas Liturgias são “sem coração”, mais ainda, “parecem não serem humanos os que celebram”. Fiquei triste com a constatação, mas é verdade. Quando vai chegar o dia em que nossas Celebrações sejam verdadeiramente participação na vida de Cristo que nos transforma em seu próprio corpo?

Brincar diante do Pai é não ter medo, é não se sentir reprimido ou podado. É ser capaz de ser o que se é. Quando nos reunimos para Celebrar, afirmamos que Deus é a razão de nossas vidas e que vale a pena ser irmão dos outros. Celebrar é comprometer-se com a vida. Não basta fazer festa! Não basta celebrar bonito! É preciso assumir o projeto de Jesus e vivê-lo na grande Liturgia da Vida. A Liturgia não é simplesmente um momento isolado mas fruto do desejo de estar com os outros para louvar e agradecer todo o recebido. Podemos dizer que sempre estamos brincando diante do Pai, e em alguns momentos partilhamos nossa brincadeira com os demais, aí acontece a Liturgia.

Você já observou como a gente foi perdendo a dimensão do brincar. Antigamente havia as brincadeiras e danças comunitárias. Muitas crianças que nascem nas cidades grandes, moram em apartamento, nem sabem cantar uma cantiga de roda. Sabe por quê? O computador, o vídeo game, o fliperama, foram substituindo as brincadeiras comunitárias. Hoje o que vale é você ter prazer, ainda que seja sozinho. Que coisa mais chata, brincar sozinho enquanto há uma imensidão de gente ao meu redor.

Isso vale também para a Liturgia. Há gente que pensa que celebra sozinho. Escolho a Igreja, o padre tal, o pastor fulano... Deus é submetido aos meus desejos e sentimentos. É uma experiência de fé que passa longe da experiência cristã. Aliás tem muita gente que vai à Igreja aos domingos, mas não sabe para quê. Muito gente é bom católico e menos bom cristão. Ser cristão é comprometer-se com o projeto de Jesus. Assumir sua causa, optar pelo preferidos do Reino, estar a serviço da vida e da esperança dos demais.

 

 

Eliomar Ribeiro, é padre jesuíta, capixaba, escritor, poeta, compositor e quando escreveu este artigo vivia em Roma onde preparava o Mestrado em Teologia com especialização em Juventude.

eliomar@jesuitas.org.br

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