sexta-feira, 25 de março de 2011

Paixão e Mudança - Assessoria na Pastoral da Juventude - Pe. Vilson Basso

Paixão e Mudança

Textos: Pe. Vilson Basso

Introdução

Como disse Dom Pedro Casaldáliga, "A gente vai ficando velho e ficando livre - vai simplificando a vida e dando atenção só ao essencial". Tenho andado muito por aí neste meu serviço aos jovens. Este pequeno livro é fruto do que leio, é ouço, vejo, aprendo e acredito.

Partilho com você algumas idéias; espero que  algumas possam ajudá-lo a encarar com força a ASSESSORIA NA PASTORAL DA JUVENTUDE.

O que você vai ler agora quer provocá-lo e levá-lo a pensar. Mais do que conhecimentos são reflexões para o seu dia-a-dia.
As duas palavras chaves que perpassam o livro são: PAIXÃO E MUDANÇA.

PAIXÃO é a síntese da nova cultura juvenil que está presente na pós-modernidade e do foco, que deve arder dentro de cada um de nós pela causa dos jovens e dos pobres.

MUDANÇA e a palavra que põe nossos pés no chão da realidade social, eclesial, juvenil e nos leva a ser agentes de transformação: UMA ASSESSORIA SÁBIA.

Os capítulos 1, 2, 3, 4 e 5 falam da realidade social, da cultura juvenil e da missão concreta da assessoria. A partir daí, a conversa é sobre as virtudes, atitudes, tentações e mística da assessoria sábia, nos capítulos 6, 7, 8 e 9.
No capítulo 10 você é chamado a pensar, organizar e agir.

Ame os jovens com paixão, para que sua assessoria ajude na mudança da realidade social, juvenil e eclesial.

Com Jetro, como Moisés, aprendamos a assessoria sábia.
A assessoria na PJ tem de ter paixão, e ser provocadora de mudança.
Com carinho e esperança.

Pe. Vilsom Basso – Dehoniano



1. A realidade

Antes de falar de assessoria, mudança e juventude, vamos fazer um rápido passeio pela realidade que nos cerca.
Nos anos 90, a pobreza se tornou mais visível: pobres embaixo de pontes e viadutos, acampados na beira das estradas, mendigos nas ruas, aumento de favelas...

A. Hoje passa-se do rural ao urbano: mais de 75% das pessoas vivem nas  cidades; vai-se do urbano ao metropolitano, isto é, as pessoas estão buscando as grandes cidades; há a passagem do desemprego ao
mercado informal: em qualquer cidade as ruas estão  cheias de gente vendendo  coisas, os camelôs, os ambulantes, por falta de outra oportunidade de emprego.

B. Há um aumento da violência. As chances de deixar de ser pobre diminuíram: "por mais que eu trabalhe, não deixo de ser pobre". "Só deixo de ser pobre se transgredir a lei: se roubar, ou traficar drogas, assaltar, seqüestrar"... Há uma sensação de que nada muda, então "vou transgredir a lei".

C. A corrupção está mais visível. Exemplos disso foram: a operação mãos limpas, na Itália; o impeachment de Fernando Collor de Mello, no Brasil; Andrés Perez, na Venezuela...

D. O desenvolvimento precisa cada vez menos do  ser humano; se produz mais com menos pessoas trabalhando. Os jovens são os mais atingidos.

E. A diferença e a distância entre as pessoas aumenta sempre mais: há jovens que falam diversas línguas, conhecem inúmeros países, navegam na Internet e jovens que nem falam ou escrevem direito a própria língua, nunca saíram de seu município e nem tocaram em um computador. Hoje há "os pobres e os ricos", ou os "lentos e os rápidos", isto é, os que tem acesso à tecnologia e os que não têm.

F. Nos anos 80 havia trabalhadores e desempregados e  quem quisesse trabalhar encontrava lugar: uma ponte ligava desempregados e trabalhadores.

Os sindicatos reivindicavam menos horas de trabalho e mais conquistas financeiras e sociais.

Hoje, a ponte que ligava os desempregados aos trabalhadores quebrou. Com a globalização da economia e o uso de máquinas cada vez mais modernas, construiu-se uma ponte de mão única que liga os trabalhadores aos desempregados. O desemprego assusta e assola todo o planeta.

G. Antes a briga era entre "dois irmãos": o capital e o trabalho; um não podia viver sem o outro: o empresário dependia do trabalhador para que houvesse produção. e o trabalhador dependia do empresário para ter seu emprego. Os sindicatos lutavam por ganhos sociais e salariais. As regras eram mais claras.
Hoje, a briga é entre "dois estranhos": "os excluídos e os incluídos" no mercado de trabalho. Quem está empregado não quer sair e cria barreiras e dificuldades para o outro entrar; aqui não há regras e normas. A maior luta dos sindicatos hoje não é por ganhos sociais e salariais e sim para salvar o emprego das pessoas.

Hoje é "feliz aquele que pode ser explorado", pois as chances de se conseguir emprego diminuíram.

H. Os países da América-Latina e Caribe nasceram com a exclusão dos indígenas, dos negros e dos lavradores:
- o indígena não era considerado gente, "não tinha alma". Vieram os espanhóis e portugueses e os dominaram;
- o escravo era mercadoria - e se vendia e comprava. Trouxeram os negros da África como mão-de-obra para o desenvolvimento; seres humanos tratados como animais; - o camponês não era considerado cidadão até pouco tempo atrás, não podia votar por ser analfabeto, quase não tinha direitos.

Os 500 anos de história da América Latina e Caribe foram e são marcados pela exclusão dos indígenas, negros e camponeses.

I. Há quem diga que o neoliberalismo é sinal do Reino de Deus.
Cuidado, seremos julgados pela história por não termos tido a capacidade de denunciar corajosamente os males do neoliberalismo como aconteceu com a Igreja que, no passado, não condenou a escravidão.
O neoliberalismo é o anti-Reino, e não o sinal do Reino. Ele produz milhões de excluídos; na virada do novo milênio, seis em cada dez latino-americanos viverão na pobreza.  O neoliberalismo, com a modernização e globalização, produz, hoje, "novos excluídos".

Os "novos excluídos", produzidos pelo sistema econômico atual, não têm esperança de vir a ter direitos: "ha os que não têm direito a ter direitos".

O novo excluído produzido pelo neoliberalismo e:
•  desnecessário economicamente, porque não freqüentou a escola, não aprendeu a disciplina do trabalho e não tem qualificação profissional que o trabalho moderno exige. O escravo era mercadoria, mas era indispensável economicamente. Os pobres de hoje são dispensáveis economicamente.

•  Incomodo politicamente por9ue entrou na festa sem ser convidado. A eles se atribuem todos os males sociais e políticos. São eles que dão a vitória eleitoral aos presidentes de nossos países. Os pobres, porém, são imprevisíveis politicamente, podem mudar seu voto rapidamente, por isso preocupam e
incomodam às elites, pois podem fugir ao seu controle.

•  É perigoso socialmente. Até alguns anos atrás a criança via um pobre na rua e coma para casa para lhe dar um prato de comida. Hoje, quando a criança vê um pobre, fica com medo, atravessa a rua, desvia dele e corre para casa a fim de se esconder e se proteger dele. Então, as pessoas pensam: "se o pobre é perigoso, ele pode ser eliminado". Antes eram os matadores de aluguel, isto é, a ordem privada e particular que fazia isso; agora e a polícia, a ordem pública, que elimina os pobres, os jovens... Tente relembrar os massacres de indígenas, camponeses, sem-terra, de  jovens, de crianças pobres que aconteceram em nosso Pais. Quem os praticou?
Depois deste rápido passeio, paremos para refletir e pensar.

Para refletir:

1. Como estes dados da realidade acontecem em meu País e na região onde vivo?
2. De que maneira a juventude é atingida por tudo isso?
3. Apesar de tudo isso, que sinais de vida e esperança vejo ao meu redor e em meu país?

Para pensar:

"É bom falar com eloqüência, mas agir é melhor" .
Pe. Leão João Dehon

 

2. Entendendo para mudar
A sociedade humana, para subsistir, precisa de três elementos: a lei, a promessa e a gratuidade.

A. A lei.
Não pode haver sociedade sem leis elementares que tornem possível a comunicação e a convivência entre as pessoas. Assim é também na família, na escola, no grupo de jovens...

B. A promessa
A lei nos coloca em relação com as pessoas. Uma vez juntos, perguntamo-nos: "Por que estamos juntos?"
Isto é olhar para frente e fazer projetos. Não se pode imaginar uma sociedade sem projetos e sem utopias.
Para entendermos isto, conto uma pequena história:
"Em um povoado havia um menino que achava a lua bonita e queria quebrar a lua para fazer dela muitas estrelas. Todas as noites o menino juntava um monte de pedras e começava a jogá-las em direção a lua. Os meninos do povoado e os vizinhos ficavam rindo dele, dizendo que ele era louco.
- O que aconteceu após um ano?
Ele não conseguiu acertar a lua, mas não havia no povoado nenhum menino que jogasse pedras mais alto e mais longe do que ele"
A utopia é necessária para a vida das pessoas e da sociedade, ela nos faz pensar e ir mais alto, ir além da maioria das pessoas.

C. A gratuidade
Estamos juntos porque há leis e porque temos projetos e utopia. Porem é necessário valorizar o presente, a alegria, a festa.
Gratuidade ~ fazer as coisas sem nenhum interesse pessoal; é estar juntos simplesmente por estar juntos; é valorizar as pessoas.
O amor está ligado à gratuidade; o amor verdadeiro é gratuito. Como nos diz Gênesis 2,2 "e Deus descansou". Ser gratuito é ter tempo para mim e para as outras pessoas.

A lei, a promessa e a gratuidade para o neoliberalismo.

A lei
Para o neoliberalismo, a lei está aí para favorecer algumas pessoas: os grandes industriais, banqueiros, latifundiários... A lei prejudica a maioria da população que é empobrecida; ela não favorece a convivência e sim a dominação de uma minoria sobre a maioria da população.
A lei acaba se transformando em "privilégio": uma  lei privada, particular e não coletiva. Em outros casos a lei vira "legalismo", uma lei sem alma, que acaba prendendo, cerceando, matando a vida e a criatividade das pessoas.

A promessa
Os neoliberais dizem que as utopias morreram, acabaram... A única promessa que a sociedade nos oferece é o mercado. É preciso trabalhar muito, produzir muito, então você vai poder comprar mais, consumir: "consumo, logo existo". Você passa de "ser humano" para "ter humano". Você deixa de amar as pessoas para amar as coisas. Para a sociedade de hoje as grandes utopias caíram, não existem mais; o sonho do socialismo acabou; a grande realidade agora é o capitalismo, o mercado.

A gratuidade
Para o capitalismo, a gratuidade, o estar juntos sem um objetivo concreto, simplesmente por estar, sem produzir nada, é perda de tempo: "tempo é dinheiro" e não se pode desperdiçar.
O lazer é incentivado como uma maneira de gerar lucro com o turismo, com as férias, com o prazer; pois hoje as pessoas trabalham menos, e sobra mais tempo para o lazer.

Para refletir:

1. Como acontece a lei, a promessa e a gratuidade no meu país, na minha família, na escola, no local de trabalho, na minha comunidade eclesial e nos grupos de jovens que conheço?
2. Como acontece a lei, a promessa e a gratuidade na minha vida pessoal? Estou contente com a minha pessoa?


Para pensar:

"A lei é como a serpente, pica mais aos que estão descalços". Ditado popular.

3. Assessoria e mudança da realidade
Nós falamos muito de "nova sociedade", de "nova pessoa humana", de "nova Igreja" que queremos construir. Eu digo mais: é preciso "construir" tudo isso, mas é preciso "ser" tudo isso também. Eu sou e construo uma nova sociedade, nova pessoa... "eu Me faço, fazendo";  "eu me construo, construindo". É preciso "ser" e "construir" ao mesmo tempo. Dar testemunho do novo que queremos construir é fundamental .
Agora, convido você a fazer um exercício, a partir da realidade onde vive e da experiência que tem:

Escreva estas perguntas numa folha e responda:

1. Como seriam as leis na nova sociedade que a gente quer "ser" e "construir"?
2. Qual o sonho e projeto?
3. Que espaço teria a gratuidade?

Contra a mundialização do ídolo da morte que o sistema neoliberal anuncia, proclamamos a mundialização do Deus da vida e sua presença criadora no Universo. Acredito que este é o caminho e o sonho novo que alimentamos.
Para ser e construir o novo que sonhamos e queremos há três passos a serem dados:

A. A utopia
Em todo trabalho de ser e construir não podemos perder, nem esquecer, a utopia, o horizonte maior que está à nossa frente; o sonho que alimentamos.
Utopia é o grande ideal na vida das pessoas; sem ideal ninguém se move. Se não há utopia, não há vida humana. Utopia é o motor da vida e da História.
Há pessoas que têm como sonho ter uma casa, carro, família e muito dinheiro.
Há pessoas que tem como utopia conseguir uma profissão boa e ser importante.
Há pessoas que têm como sonho uma vida mais  digna para os jovens drogados, aidéticos, violentados.
Há pessoas que tem como utopia uma vida mais  digna para todos. É o sonho de uma mudança estrutural da sociedade.

B. A ação local
Este é o segundo passo para quem sonha "ser e construir" o novo.
E acreditar que a vitória de hoje. por menor que seja, contribui para a mudança estrutural, social .

Os pequenos projetos vão fazendo a vida acontecer; com ações simples, concretas e possíveis.

A nova opção é combinar a luta estrutural, a utopia, com a luta conjuntural dos projetos históricos locais, do cotidiano. Vivemos sempre entre a utopia e o dia-a-dia.

A utopia é universal e o projeto histórico é local. Superar certas idéias como "se dou esmola, atraso a revolução" e "não vou desapropriar a terra de
vocês, para não acabar com as lutas".

Saber que se não sou capaz de mudar alguma coisa aqui e agora, não sou capaz de mudar nada no futuro. O novo se dá por ações concretas.

O mundo novo se gesta por milhares e milhares de ações de vida. É preciso ligar sempre o "agora" com a grande "utopia". É preciso pensar globalmente e agir global e localmente. Os meios devem ser tão dignos quanto os fins. A "utopia"  e a "topia" devem caminhar de mãos dadas. O 'Já" e o "ainda não", alimentam-se e se sustentam mutuamente.

C. O Projeto alternativo
Este é o terceiro passo para quem sonha "ser e construir" o novo.
Todos os dias são realizadas inúmeras ações locais que trazem dentro de si "sementes do novo" que queremos ser e construir, como novas atitudes, novas conquistas, novos caminhos, novas relações, novos espaços.

Faz-se necessário:
a.  Recolher estas experiências.
b.  Escrever, registrar, fotografar, filmar, documentar estas experiências.
c.  Refletir e interpretar estas experiências. d. Reescrever estas experiências percebendo o PROJETO ALTERNATIVO que está sendo gestado e construído através das inúmeras ações.

Estas ações são realizadas pela Pastoral da Juventude, por outras pastorais, outras religiões, por partidos políticos, por organizações não-governamentais, sindicatos, associações que tenham como objetivo claro ir desenhando um PROJETO ALTERNATIVO para a sociedade que temos hoje, construído em parceria.

E o macroecumenismo que conjuga dialeticamente a identidade, o pluralismo e a complementaridade de cada uma destas organizações.
A utopia, a ação local e o projeto alternativo são três passos fundamentais para responder aos desafios que a realidade nos traz. Qualquer ação ou projeto que realizamos deve conter dentro de si estes três elementos para, de fato, produzir mudança.
A lei, a promessa e a gratuidade que queremos ser e construir como resposta ao que o neoliberalismo nos oferece, para se tornarem concretas, precisam passar por este caminho.
Para refletir:
1. Em minha ação de assessoria busco ser e construir a nova sociedade? Como?
2. O que é utopia, ação, local e projeto alternativo? Vejo estes três elementos em minha vida de assessor? Como? Onde?
3. Os projetos que realizo ou acompanho têm estes três elementos?

Para pensar:

"A pessoa que quer mudar a sociedade não pode ter idéias tímidas".
Pe. Leão João Dehon

 

4. Pós-Modernidade e cultura juvenil - é preciso escutar os jovens
A juventude é a parte mais sensível da sociedade, na qual se manifestam as mudanças, boas OU não. Vivemos um novo clima cultural marcado pelo subjetivo, individualismo e pela mística.

O mais bonito e desafiador é o que se está gestando; ainda não nasceu o que queremos. Vivemos entre o "crepúsculo e o amanhecer". Estamos em trânsito, em passagem, do "homo sapiens", que valoriza muito a razão, para o "homo sensiens", que raciocina com o coração. Se não se sente, não é verdade.
Antes era a razão:"penso, logo existo"; agora é a satisfação  pessoal: “consumo, logo existo”. Antes o sonho era coletivo, agora é individual. O sentimento ocupou o lugar da razão, a paixão ocupou o lugar da
razão. Esta geração de jovens é capaz de se apaixonar, não por idéias, e sim por uma causa ou uma pessoa; por algo que se passa tocar, sentir.

Os jovens vivem a crise de identidade, por isso a grande importância que se dá à camisa de um time de futebol a camisa é mais do que uma camisa. Quem sou? O que quero? A busca de pertencer a um grupo...

No corpo o jovem se encontra; sentir-se e sentir a emoção, tocar e ser tocado... "E quase uma experiência religiosa, sentir que ressuscito se me tocas, beijar a boca tua, merece um aleluia..." diz Henrique Iglesias em uma de suas canções.

Os jovens querem estar juntos, na multidão de um show de rock ou de um estádio de futebol; é como se fosse uma reunião religiosa, celebra-se o ídolo que canta ou o time que joga, tem-se a sensação do prazer e do poder, aqui e agora "não sei o que quero, mas o quero aqui e já". É outro o sentido do tempo e da História. A escolha está em nossas mãos:

Estes elementos nos trazem desafios como:
A.  Desenvolver uma espiritualidade juvenil que tenha em vista a identidade: - "Ah, Senhor Javé, eu não sei falar porque sou jovem"."... não diga isso, pois eu estou com você" (Jr 1,1-10).

B.  Que a Pastoral da Juventude seja um espaço onde o jovem reencontre sua identidade e possa desenvolver o sentido de comunidade; que a PJ  seja uma camisa, uma bandeira... mais que uma camisa, mais que uma bandeira...

C.  Que a Pastoral da Juventude seja uma pastoral que também satisfaça o jovem hoje; que dê sentido também ao seu aqui e agora. Que a PJ fale de "passado" e "futuro", mas que tenha também propostas concretas para o "hoje" do jovem.

D.  Que a PJ, ao falar de fé, mais do que idéias e dogmas, revele uma pessoa. Jesus Cristo, e um projeto, o Reino, que se revela nos gestos concretos e palpáveis de Jesus de Nazaré.

Isto exige estratégias para a assessoria na Pastoral da Juventude, como:
a)  reconhecer que também somos parte desta cultura, que sentimos o futebol, as músicas, a moda e os modismos, os problemas juvenis; que ainda não somos pessoas salvas, prontas, acabadas, insensíveis;

b)  escutar e compreender os jovens, a partir dos jovens, crescendo junto com eles, compartilhando de sua vida;

c)  ter capacidade de entender os sinais, símbolos e mitos juvenis e de comunicar-se com o coração dos jovens. Segundo reflexão de estudiosos, a Igreja e a Pastoral da Juventude passaram pela época da reflexão social e militância, estamos na época da mística e erótica e vamos para o tempo da Teologia e da Arte. Tudo isso é bonito e segue o ritmo gostoso do pós-moderno. Por outro lado, corre-se o risco de cair numa PJ light, "gostosa", que perde o específico e o radical da opção pelos pobres. Sobre este assunto, Dom Pedro Casaldáliga assim se expressa: "É preciso tomar cuidado com a idéia de que o importante é o instinto e o instante; da mística se passa a erótica e da erótica a herética. O nosso paradigma é Jesus Cristo. É preciso
segui-lo radicalmente, no serviço aos pobres. Cuidado para não suavizar o chifre do touro".

Sim, de um lado é preciso ter cuidado, porém é importante saber que esta geração ainda pode se apaixonar radicalmente por uma pessoa ou por uma causa. Por isso trago aqui a história do circo e do palhaço:

“Em um circo havia um palhaço muito engraçado. Era só abrir a boca e todos riam.

Um dia, o circo pegou fogo e ele correu à cidade para dizer ao povo que o circo estava queimando.

Só que ele dizia: 'o circo está queimando' e todos riam, achavam muita graça, não acreditavam nele. E, assim, o circo se queimou todinho.

O que o palhaço devia ter feito?
A solução era pegar um jovem pelo braço e levá-lo para que visse o incêndio no circo e que o jovem mesmo fosse então dizer ao povo que era verdade o que o palhaço estava dizendo: 'O circo está pegando fogo' ".

Que lições, nós podemos tirar desta história?
Nós, assessores de PJ, estamos como que disfarçados, de palhaços de circo.
O que fazer para comunicar aos jovens que não estão "no circo" que o que está acontecendo com a juventude é um caso de vida ou de morte? É sério e importante? Que o circo está pegando fogo?
Assessores, "quanto a nós, não podemos calar diante do que temos visto e ouvido" (At 4,20).

Que os jovens possam conhecer experiências concretas, pois a lógica jovem é mais visual, de imagens, do que de palavras.

Vivemos na sociedade da imagem. E preciso que sejamos imagens vivas do que cremos e dizemos.

Assessores da PJ, "palhaços de circo", convidem os jovens a viver a experiência do que vocês têm experimentado. Não digam a eles o que fazer e sim que experimentem. "Mestre, onde moras? Vinde e vede. E ficaram com ele" (Jo 1,39).

Por fim, digo, nós, assessores, cremos ter resposta para tudo e nem escutamos as perguntas que os jovens nos fazem.
É preciso escutar os jovens.
"Um ouvido voltado para os jovens e o outro para o Evangelho", parafraseando o Bispo Mártir Angelelli, sem perder a radicalidade e a alegria.
Creio que na parábola das 100 ovelhas, Jesus se preocupa muito também com as 99 que estão no redil, sem iniciativa, acomodadas, sem criatividade para "ir aos jovens que estão em outros campos e escutar seus clamores".
Não tenha medo de ser o que é, siga o exemplo de Jesus que, sendo Deus, se fez gente, de tal modo que o povo não se deu conta que Ele era Deus "Não é ele o Filho do Carpinteiro?" (Lc 4,22). Jesus se encarnou. Assessor da Pastoral da Juventude tem de se encarnar na vida e na cultura juvenil, se quiser
evangelizar de fato. "As alegrias e as esperanças dos jovens devem ser as alegrias e esperanças do Assessor da Pastoral da Juventude", digo, parafraseando a Gaudium et Spes, nº 1 do Vaticano II.

Para refletir:

1. Que lições tiro deste pequeno texto para meu trabalho junto aos jovens?
2. Que outros elementos da pós-modernidade e cultura juvenil acrescento a esta breve reflexão?


Para pensar:

"As alegrias e as esperanças dos jovens de hoje são as alegrias e as esperanças dos assessores da Pastoral da Juventude" (cf. Gaudium et Spes nº 1).

 

5. Que assessoria ser, em resposta à cultura juvenil pós-moderna?

Olhando a realidade percebemos que há três modelos culturais presentes nas pessoas; um dos modelos predomina, mas os três estão aí e se manifestam em palavras, expressões ou atitudes.

A. Cultura de Imitação
A pessoa olha para o passado como um ideal a ser imitado e restaurado dizendo: "no passado foi melhor", "antigamente é que era bom".
Este tipo de cultura aparece em expressões como:
-  "Os jovens de hoje não respeitam mais nada".
-  Justificam-se imposições, com esta frase: "isto é para seu bem".
-  Ressalta-se o valor do sacrifício: "tudo tem de ser feito com sacrifício; é necessário suar a camisa" .
-  Valorizam-se personagens do passado, como se fossem deuses... heróis nacionais, jogadores de futebol...

Isto acontece também nas famílias, na escola, nas igrejas...

Neste modelo cultural não há lugar para a utopia, pois há uma volta ao passado.

B. Cultura de Projeto
É a que diz que o passado é algo que deve ser  superado e mudado. O importante é construir o futuro, ter projetos e lutar por eles.
Aqui há lugar para as grandes utopias. E a sensibilidade do militante, que se manifesta em frases como esta:
- "Este é um mundo indigno do ser humano. Temos de construir um mundo melhor"
É animada pelas ciências sociais, Teologia da Libertação e alimentada por convulsões sociais como a dos estudantes que no ano de 1968 marcaram época em vários países.

Os movimentos revolucionários de libertação nacional acontecidos na América Latina nas últimas décadas foram marcados por esta cultura.
Para estas pessoas vale a pena sacrificar a felicidade pessoal pela felicidade do povo, pelo projeto de transformar a sociedade.
Aqui conta muito a razão, o pensar, ao invés do sentimento.

C. Cultura da Paixão
Muitas pessoas têm a sensação que o mundo no qual vivem já não responde às suas expectativas.
Esta cultura nasce do desencanto de tantas promessas que são feitas. Por isso, o lance é viver o presente, por que: "à força de sacrificar o presente, por causa do passado ou do futuro, a vida se acaba. O que importa é viver e ser feliz agora".

Os jovens dizem: "não sei nada do passado; meus pais gastaram sua vida querendo construir um futuro melhor; eu quero viver o presente". Neste modelo cultural, o sentimento ocupa o lugar da razão. Aqui vale mais o sentimento.
É a nova cultura juvenil. Antes as crianças olhavam para os adultos como modelos, hoje os jovens servem de modelos de vida para as crianças e para os adultos. E cultura típica dos nossos dias.
Resumo:
A cultura da imitação valoriza o passado, a cultura de projeto valoriza o futuro e a cultura da paixão valoriza o presente. Estes três modelos estão presentes em cada pessoa, porém um deles predomina. E a gente pergunta:
-  Por que poucas pessoas se dispõem a acompanhar os jovens e a Pastoral da Juventude?
-  Por que os assessores de PJ têm dificuldade para dialogar com os jovens de hoje?
A meu ver, boa parte dos problemas e dificuldades de acompanhar e dialogar com os jovens de hoje existe porque:
a)  fomos formados para discutir com as pessoas que não querem mudança e ficam sonhando com a volta ao passado;
b)  fomos formados para somar forças com os jovens e todos os que querem um futuro melhor, na luta, na militância;
c)  não fomos preparados para dialogar com os jovens que não se importam com o passado e nem querem saber do futuro; que é a geração jovem de agora, que pensa em viver o hoje, o presente, por desencanto ao que está ai.

O QUE VOCÊ PENSA DESTAS TRÊS AFIRMAÇÕES QUE FIZ?

-  Nos anos 60, a Ação Católica especializada, com o Método Ver Julgar e Agir, ajudou os jovens a assumirem um compromisso social. Vieram então as ditaduras militares em toda a América Latina.
-  Os anos 70 foram marcados pela presença dos Movimentos Juvenis Nacionais e Internacionais, que deram mais atenção ao sentimento e à conversão pessoal dos jovens.
-  Nos anos 80 surge a Pastoral da Juventude e as Pastorais Especificas que revalorizam o método Ver, Julgar e Agir e o compromisso sócio-político dos jovens.
-  Os anos 90 revelam "uma nova cultura juvenil", com grande acento no individual, no corpo, no afetivo e no sagrado.
Fica um questionamento no ar:
- Como valorizar o humano o afetivo, o pessoal o belo e o sentimento, sem perder a dimensão do compromisso, da critica, do comunitário e da mudança?
De um lado, a assessoria tem de se preocupar com os problemas pessoais e afetivos e espirituais dos jovens, o que convencionamos chamar de Assessor Psicológico, respondendo à cultura da paixão.

De outro lado faz-se necessário trabalhar também a dimensão da consciência crítica e do compromisso com a mudança social, o que chamamos de Assessor Sociológico, respondendo à cultura de projeto.

Fazendo uma breve análise histórica da Pastoral da Juventude latino-americana e caribenha percebemos que, nos anos 60, os assessores foram mais sociólogos; nos anos 70 os assessores foram mais psicológicos e nos anos 80 novamente foi mais marcante a assessoria sociológica. Os nossos dias exigem uma assessoria sábia, isto é, que seja psicológica e sociológica ao mesmo tempo. Os novos tempos pedem que o assessor saiba dar atenção pessoal, afetiva e humana a cada jovem, que valorize a lógica jovem, que é mais visual do que discursiva e que, ao mesmo tempo, vá despertando
neles a consciência crítica e o compromisso social.

Este capítulo cinco faz como que a síntese dos capítulos anteriores e a passagem para os próximos.
Sugiro que você o analise bem. Talvez dê mais uma lida nos quatro primeiros capítulos. Depois responda às perguntas que seguem no "para refletir". Seja uma pessoa sábia e tente compreender bem o que significa ser  uma "assessoria sábia", pois isto vai ser importante para o entendimento dos próximos capítulos.

Para refletir:

1. Olhando para a sua história pessoal, com que modelo de cultura você mais se identifica?

2. E os jovens com quem você convive, com que modelo cultural se identificam?

3. Estes três tipos de cultura se manifestam na realidade onde você vive? Como? Por que temos dificuldade de entender, dialogar e acompanhar os jovens de hoje?

4. A sua assessoria é mais psicológica, sociológica ou sábia? Por quê?

Para pensar:

"Será preciso inventar algo novo e o novo será inventado pelos jovens".
José Comblin

 

6. Virtudes da assessoria sábia
A assessoria sábia, que une o assessor sociológico e o psicológico, é desafiada a ter virtudes que demonstrem e alimentem esta vocação de servir aos jovens; eis algumas que considero indispensáveis:

A. Ser coerente entre o que se diz e o que se faz

O grande desafio da pessoa humana e do assessor da PJ é diminuir a distância entre o discurso e a prática, de tal maneira que, em algum momento, a prática seja discurso e o discurso seja prática.

Não é possível alcançar coerência total, absoluta. Ser santo é ser o menos incoerente possível.

Se falo em nova mulher e novo homem, tenho de buscar "ser" isso em minhas atitudes.

Se falo em nova sociedade, que isso apareça nos gestos que realizo. "Cuidado, o que você faz grita tão alto que o que você diz ninguém escuta', ensina-nos o ditado popular.

Jesus fala em Atos 1,8 "sereis minhas testemunhas". Os apóstolos dizem "disto nós somos testemunhas" (At 3, 15). E eram muitos os que os seguiam.

"As pessoas de hoje dão mais valor às testemunhas do que aos mestres. Se dão valor aos mestres é porque são testemunhas", diz Paulo VI.

A virtude da coerência é libertadora e provoca conversão e seguimento.

B. Praticar uma paciência impaciente
Se o assessor enfatiza apenas a paciência, cairá no discurso tradicional do "tem paciência jovem, isto é vontade de Deus"; atitude que reforça o fatalismo.

Dar valor somente à impaciência é cair no ativismo e na superficialidade; é não ter paciência; é não respeitar o ritmo e a caminhada dos jovens.

O segredo é o desafio é "ser pacientemente impaciente" e "impacientemente paciente" no serviço aos Jovens.

C. Mudar a pessoa e a realidade
Há pessoas que dizem: "não se pode transformar o mundo, sem transformar as consciências", Com esta afirmação, corre-se o risco de primeiro querer mudar o coração de todas as pessoas, para depois mudar a realidade.

A pessoa e a realidade devem ir mudando juntas. A pessoa muda no processo de mudança da realidade. "Eu me transformo ao transformar. Eu sou feito pela história, ao fazê-la".

O assessor da PJ deve ter sempre presente em sua vida esta verdade.


D. Evitar o espontaneísmo sem cair na manipulação
O espontaneísmo é não ter nada pronto, nada  pensado; é não programar nada; é uma falsa democracia e um desrespeito aos jovens.

A atitude manipuladora é um jogo de "Cartas marcadas", onde tudo já está pensado e decidido, sem participação dos jovens.

A assessoria precisa ter sempre uma postura "radicalmente democrática", pensando, analisando e decidindo junto com os jovens, onde eles sejam, de fato, sujeitos do processo de pensar, organizar e agir.

E. Limitar-se para servir mais
Não querer fazer tudo, nem abraçar o mundo. A assessoria não pode ser como borboleta, que vai de flor em flor, sem se fixar muito tempo em nenhuma delas.

Ser assessor da PJ exige que se escolham algumas prioridades, algumas atividades e que se faça bem feito aquilo que se assume. E melhor fazer  poucas coisas, bem feitas, do que fazer muitas, superficialmente.

É preciso limitar-se para servir mais e melhor. Veja a atitude de Jesus e seu apostolado: durante três anos anunciou ao redor do Mar da Galiléia; apenas três vezes subiu a Jerusalém, e, no entanto, sua fama e sua mensagem se espalharam por toda a região, por todo o mundo.

A maioria das vezes não somos liberados exclusivamente para o trabalho com a pastoral da juventude; mesmo assim, entre todas as responsabilidades que temos, é decisivo e importante que priorizemos o serviço aos jovens.


Para refletir:

1. Qual destas virtudes tenho que cultivar mais?

2. Que outras acrescentaria?

Para pensar:

"Cuidado, o que você faz grita tão alto, que o que você diz ninguém escuta''.
Ditado popular 

 

7. Atitudes da assessoria sábia

A Pastoral da Juventude é a maior escola de lideranças que a Igreja tem; ali o jovem aprende a falar em público, a se expressar, a coordenar... eis algumas atitudes que se exige da assessoria da PJ:

A.  A assessoria deve ter uma atitude de respeito às etapas do grupo de jovens e à etapa de crescimento de
cada pessoa, dando atenção a cada jovem como se fosse único, tornando possível seu protagonismo.

B.  É necessário enfrentar o conflito - Sem conflito não  há crescimento pessoal, grupal e comunitário. A assessoria não deve fugir dos conflitos e nem por "panos quentes" nos mesmos. O conflito faz parte das relações humanas e grupais e deve ser enfrentado e superado.

C.  Não fugir do risco - Servir aos jovens é aceitar o risco como algo bonito e forte. E confiar no jovem; é não ter medo de errar: "só erra quem tenta fazer algo" Mais vale o risco por tentar do que a segurança por não ter feito nada.

D.  Aprender com o fracasso - Este, talvez, seja o momento mais difícil e mais bonito de ser assessor. E o momento de oferecer o ombro e chorar junto com os jovens; ao mesmo tempo é preciso ter serenidade, clareza e firmeza de perceber, junto com eles, as  causas do fracasso, e poder enxergar e conceber novos caminhos e novas estratégias de ação.

E.  Abrir caminhos novos - A assessoria tem a missão de abrir espaços, facilitar, tornar possível ao jovem o acesso ao diálogo com os adultos, com outras organizações, com a Igreja.

À assessoria cabe favorecer o diálogo, o trabalho em parceria e o  protagonismo juvenil: "é necessário que ele cresça e que eu diminua" diz João Batista (Jo 3,30).


Para refletir:

1. Assessoria exige atitudes concretas. Com qual destas você mais se identifica?
2. Qual a mais exigente?


Para pensar:

"É necessário que o jovem cresça e que o assessor diminua" (cf. Jo 3, 30). 

 

8. As tentações da assessoria sábia

A assessoria na PJ é um serviço exigente e bonito. Os jovens cobram coerência e dedicação total. A realidade política, econômica e social influenciam.

O assessor da PJ, alem de todos os desafios que tem de enfrentar, passa por quatro tentações:


A. Renunciar à História
O povo, os pobres e os jovens esquecem rapidamente os fatos.
As dificuldades na PJ podem levar a assessoria ao desânimo.
O assessor não pode esquecer que "é parte da História do povo de Deus", de um Deus que se encarnou, se fez gente, limitou-se no tempo e em um povo. Ele é Emanuel, Deus presente em nossa história, e que estará conosco até o final da mesma (Mt 28,20).

O assessor não pode renunciar â sua missão de ser parte e memória da caminhada da PJ e de ser a pessoa que estimula o resgate e o registro da história dos jovens, do grupo, da comunidade, da PJ.

Na hora da dúvida, do sufoco, do fracasso, lembrar que muitos jovens e assessores já escreveram a sua parte na história da PJ; resgatar a memória dos mártires e dos que deram a vida pelos jovens e pobres, pois seu sangue e vida são sementes de mais vida. A história da PJ precisa continuar a ser construída e a assessoria tem papel fundamental nesta missão.

O Evangelho nos diz que "Jesus crescia em estatura, sabedoria e graça diante de Deus e dos homens e que Maria guardava todas estas coisas em seu coração" (Lc 2,51-52). A assessoria ajuda a escrever, preservar e atualizar a história da PJ.

B. Renunciar à dor
A cultura de nossos tempos cultiva o corpo, a beleza, o prazer e rejeita tudo o que exige sacrifício.

As pessoas não querem ouvir falar de “jejum e penitência”, mas fazem regimes e dietas duríssimas para manter a silhueta, o corpo em forma.
Um grande risco que a Igreja corre é o do "hedonismo eclesial": os agentes de pastoral que buscam só o que é fácil, deixando de lado tudo que é exigente e difícil.

Jesus diz "quem quiser ser meu discípulo tome sua cruz e me siga" (Mt 1~,24).

São Paulo afirma:
"Não quero gloriar-me, a não ser da cruz de Cristo" (G1 6,14) e conclui dizendo que: "A Cruz é loucura para os pagãos e sabedoria para os que crêem"

Aqui podemos lembrar a cruz que carregaram e carregam amigos e amigas nossos por optar pela assessoria na PJ. O preço disso na vida familiar, afetiva, social e econômica.

Ministério da assessoria também é cruz, é dar-se permanente e totalmente pela causa dos jovens.
Não renuncie a ela.

C. Renunciar à promessa
E Deus diz a Jeremias: "Desde o ventre de tua mãe eu te escolhi" (Jr 1,5). O S1 67,7 reza: "Deus, o nosso Deus, nos abençoa" e o S1 22,4 exclama: "Ainda que eu caminhe por um vale tenebroso, nenhum mal temerei, pois estás junto a mim". Não podemos renunciar à esperança, pois Deus está conosco. Podem cair todas as utopias, mas continua de pé a Ressurreição de Jesus, a grande utopia, da qual somos chamados a ser testemunhas (At 1,8).
Podemos e devemos esperar contra toda esperança (Rm 4, 18). Aos pobres sempre resta a esperança.
Ministério da assessoria é alimentar a promessa, o sonho e a esperança dos jovens.

D. Renunciar a gratuidade
O capitalismo nos diz que "tempo é dinheiro" e que, por isso, não se pode desperdiçá-lo. E preciso produzir sempre.

Jesus porém diz aos discípulos "vamos a um lugar tranqüilo para descansar" Mc 6,31).

Podemos pensar que tudo depende de nós, não  dormimos mais direito; não temos tempo para visitar os amigos, para ficar com a família. Não temos mais tempo para o sentimento e para o cultivo pessoal.

Diz o Evangelho que Jesus amava Marta, Maria e Lázaro" (Jo 11,5) e que "Jesus chorou" a morte do amigo (Jo 11,33).

Está na hora de recuperar o sentido e o valor da gratuidade, do sentimento; é a mística do lazer.

Não podemos cair na tentação de renunciar a História, a dor, à promessa e a gratuidade.


Para refletir:

1. Em qual destas tentações caio mais?
2. Que outras tentações pastorais tenho?


Para pensar:

“Quem quiser ser meu discípulo, tome sua cruz e me siga” (Mt 16,24) 9.

 

A mística da assessoria sábia

Vou falar de mística e espiritualidade ao mesmo tempo, juntas, pois se interpretam e se completam.

A espiritualidade e a mística do assessor da PJ deve ser reinocêntrica, ter como centro e inspiração o Reino de Deus e ser a espiritualidade do Seguimento de Jesus, paradigma da vida da assessoria: "Se alguém quer me seguir, renuncie-se a si mesmo, tome sua cruz e me siga" (Mc 8,34). A opção radical pelos pobres é que vai garantir nossa fidelidade no seguimento.

Como dizia na introdução, a gente vai ficando velho, ficando livre, e criando coragem de dizer algumas coisas: por isso digo: assessor que não reza, não pode ser assessor da PJ. Sem disciplina não rezamos. Oração é tratar de amizade com quem sabemos que nos ama.

Quanto mais místicos formos, mais revolucionários seremos; quanto mais revolucionários, mais místicos. O espírito tem duas asas, a asa da profecia, compromisso e martírio e a asa da contemplação.

Nossa vida de assessoria e de espiritualidade é como o caminho de Paulo para Damasco. Sabemos em que cavalo andamos; estamos ainda na oportunidade de cair do cavalo; mais tarde poderá ser tarde (cf. At 9,4).

Do assessor da PJ exige-se uma espiritualidade  sólida, capaz de dar razão da própria esperança; Uma profunda mística cristã e missionária que dê coragem e audácia no serviço aos jovens.

Uma espiritualidade fundamentada na Palavra de Deus e na Eucaristia: Palavra de Deus que aquece o coração (Lc 24,32) e Eucaristia que abre os olhos (Lc 2~2,30-31) para ver a realidade dos jovens e dos pobres e que leve o assessor de volta para a missão (Lc 24,33), faça-o missão, pois a pessoa toda é missão.

Uma espiritualidade que alimenta e dá sentido à vida e é alimentada e fortalecida por ela.

O assessor da PJ deve deixar-se conduzir pelo Espírito de Deus que transforma tímidos discípulos em testemunhas corajosas da ressurreição (Jo 20,21 e At 2,32).

A mística exige da assessoria uma profunda sensibilidade e respeito com a maneira de ser e de viver do povo, dos pobres, dos jovens. Um olhar de simpatia, acolhida e atenção para as mudanças culturais de nossos tempos.

Uma espiritualidade que se alimenta e provoca ternura, compaixão, acolhimento, disponibilidade e empenho em sarar, curar e tratar as feridas dos jovens que são jogados à beira da estrada pelo neoliberalismo (Lc 10, 29-37). E olhar os jovens com amor (Mc 10,21) e dizer: "Jovem, eu te ordeno, levanta-te" (Lc 7, 14).

Uma mística que estimula a criatividade; coragem e ousadia para propor novos caminhos e metodologias no serviço à juventude, valorizando a vontade do jovem.

Espiritualidade que exige acolhida do outro,  em especial ao jovem que pensa, age e crê diferentemente de mim. É difícil e bonito. E profundamente cristão. "Se amais somente os que vos amam, que merecimento tereis?" (Mt 5,46).

Mística é o assessor ter uma opção claríssima pelos pobres que é condição necessária e irrenunciável do caráter evangélico da ação. E ter opção e ser  pobre com os pobres. Dar testemunho efetivo. A simplicidade convence e converte as pessoas. O exemplo grita bem alto. A assessoria deve ter sensibilidade social e despertar esta sensibilidade no coração e na mente dos jovens. Só é livre quem é pobre; só é pobre quem é livre. Espiritualidade de assessoria é ter opção afetiva e efetiva pelos jovens. Os jovens devem saber e perceber que estamos sempre do seu lado, aconteça o que acontecer; se estão certos, para apoiar; se estão errados, para chorar com eles e ajudá-los a levantar a cabeça. Isto exige desprendimento de aspirações pessoais a cargos e regalias, pois estar sempre do lado dos jovens é causa de muitas críticas, conflitos e perseguição. Porém, "Bem-aventurados os que fazem opção pelos jovens, alegrai-vos e exultai" (cf. Mt 5, 10-12).

Mística é participar alegre e ativamente da vida  de comunidade; é ajudar o jovem a descobrir e amar a Igreja; é quebrar a idéia de individualismo e provocar o sentido eclesial e comunitário no coração da juventude. É na comunidade que a gente é feliz (At 2, 42-44), e que a gente alimenta a fé. Os jovens são a juventude e a alegria da própria Igreja.

Espiritualidade é mostrar às pessoas que a assessoria aos jovens nos faz pessoas conscientes, comprometidas, porém, também pessoas felizes, alegres, realizadas. A PJ é um espaço onde a pessoa pode e deve ser feliz. Que não possam dizer de nós o que disseram em Caná: "Eles não têm mais vinho" Jo 2,3.

Sim, precisamos ser pessoas conscientes, críticas, porém, pessoas felizes e realizadas, que tem o vinho da alegria.

Mística é crer na mudança da realidade, da Igreja e das pessoas. E acreditar na utopia, na ação local e no projeto alternativo. E ajudar a recolher as sobras (Mc 6, 43), a escrever, refletir e reescrever um projeto alternativo para a sociedade, como povo organizado (Mc 6, 39-40), onde todos possam ficar saciados (Mc 6, 42). É saber e entender de planejamento e de estratégias.
Espiritualidade é ter um grupo de assessores com quem partilhar a vida e os sonhos; com quem fazer revisão de vida e rezar; alguém para quem se possa contar tudo o que foi feito; com quem se possa retirar para descansar, com gratuidade (Mc 6,30-32) e para a formação integral.

Mística não é só rezar, mas sem oração não há mística e espiritualidade que se sustente; ter pelo menos uma hora de oração pessoal por dia e o mínimo que se pode esperar de um assessor da Pastoral da Juventude: "não pudestes vigiar pelo menos uma hora comigo?" (Mt 26,40), diz Jesus aos assessores da PJ.

A Pastoral da Juventude é uma pastoral conflitiva e exigente. O assessor da PJ deve ser uma pessoa de muita oração, para poder ser sereno e firme; terno e profético, no serviço à juventude. Quem descobre a importância da oração, da mística, da espiritualidade, da intimidade com o Pai, descobriu o essencial, todo o resto vem por acréscimo. "Marta, Marta... tu te preocupas com muitas coisas, uma só é necessária" (Lc 10,41). Sem disciplina não há mudança. Assessor da Pastoral da Juventude tem de rezar todos os dias, com disciplina e alegria.

Mística e espiritualidade é a busca da santidade.
O assessor da PJ é chamado a ser santo. As características da santidade são: "misericórdia; firmeza e paciência nas tribulações e perseguições, e alegria" (cf. Puebla n" 383):
-  A misericórdia na acolhida ao jovem ferido, machucado, que errou o caminho; ao jovem drogado, viciado, violento, prostituído, violentado.

-  A firmeza e a paciência nas tribulações e perseguições são importantíssimas  para quem quer estar sempre do lado dos jovens; vem a perseguição, a calúnia, as críticas, a incompreensão, as cobranças, quando se opta pela juventude. -  A alegria deve ser marca do "pejoteiro", do assessor da PJ, que é a pastoral da alegria e da esperança.

"Alegrai-vos sempre no Senhor" (M 3, 1 e 4,4). Dar testemunho de uma pessoa realizada e feliz é decisivo se quisermos que os jovens acreditem na proposta da Pastoral da Juventude.

"Sede Santos porque eu sou Santo", diz o Senhor em Lv 19,2; 11,44 e Mt 5,48.

Para concluir, digo que mística e espiritualidade é ouvir a voz, abrir a porta, sentar à mesa e cear com ele (cf. Ap 3,20). Jesus Cristo é o nosso grande caso de amor. É preciso alimentar esta intimidade com ele na nossa missão de assessoria na PJ.


Para refletir:

1.O que mais inquietou você nesta série de afirmações sobre mística e espiritualidade?
2. Você reza pelo menos uma hora por dia?

Para pensar:
"Assessor da PJ, eis que estou à porta e bato. Se você abrir a porta, entrarei, sentarei à mesa e cearei com você" (cf. Ap 3,20). 

 

10. Assessoria, paixão e mudança.

Uma frase que li em um cartaz no ano de 1991, no Maranhão, marcou muito minha vida. O cartaz dizia o seguinte: "pensar, organizar e agir".

Lembro-me que anotei em minha agenda. Em 1992 fui convocado para fazer o sermão na Missa da 1ª Romaria da Juventude do Maranhão e me disseram: "Vilsom, tem de ser uma fala bem forte, que mexa com os jovens".

Quando parei para organizar as  idéias, vieram-me à mente as três palavras: "pensar, organizar e agir" e eu complementei: "o jovem que pensa, se organiza e age". Fui então em busca de um texto bíblico que fundamentasse minha reflexão. Procurei muito e encontrei este, onde os discípulos de João Batista lhe perguntaram: "És tu ou temos que esperar outro?" e Jesus fala: "Ide dizer a João: os cegos vêem, os mudos falam e os coxos andam!”
A reflexão que fiz foi mais ou menos esta: - O jovem que pensa, se organiza e age.

A. "O jovem que pensa".
O que é pensar? Pensar e abrir os olhos para ver a realidade social, eclesial e juvenil. "Ide dizer a João: os cegos vêem!.. (Mt 11,5).

A Pastoral da Juventude ajuda os jovens a pensar. A assessoria na PJ tem a missão de estimular os jovens a enxergar mais e melhor a realidade que está ao seu redor, as causas e conseqüências de tantos problemas e desigualdades.
Pensar é abrir os olhos.

B. "O jovem que pensa, se organiza".
O que é organizar? Organizar e ajudar o jovem a soltar a língua, a dizer o que sente e quer; "Ide dizer a João:... os mudos falam!" (Mt 11,5).
A Pastoral da Juventude é a maior escola de lideranças que a Igreja tem. Ali os jovens aprendem e tem espaço para falar em público, coordenar encontros e reuniões; a assessoria na Pastoral da Juventude tem a bela tarefa de favorecer o crescimento e o protagonismo das lideranças jovens. Organizar é soltar a língua.

C. “O jovem que pensa, se organiza e age”.
Agir é caminhar com as próprias pernas, com convicções pessoais, com princípios evangélicos claros e definidos. "Ide dizer a João:... os coxos andam" (Mt 11,5).

Agir é andar com as próprias pernas.
Acredito que esta chave de leitura que proponho do texto de Mateus (11,1-6) ajuda a entender o que é Pastoral da Juventude e qual o papel e a missão do assessor da PJ.

A PJ é ação organizada da Igreja que possibilita ao jovem pensar, organizar e agir, valorizando a paixão e a mudança.

A assessoria na PJ é desafiada a estar ao lado e apoiar os jovens neste processo e caminhada. Por isso, e para isso, a assessoria tem de ser sábia,  isto é, sociológica e psicológica ao mesmo tempo, preocupando-se com o jovem como pessoa e com o jovem como agente de transformação eclesial e social. E importante aprender com o passado, mas é preciso valorizar a cultura de projeto, alimentando a utopia no coração dos jovens e olhar com respeito  e diálogo para a cultura de paixão, dando respostas concretas aos desafios e dia-a-dia dos jovens, ao seu "hoje".

Alem das virtudes, atitudes e mística quero dizer  que a assessoria sábia deve cultivar ainda dois valores evangélicos radicais: a simplicidade e audácia.
Assessores da PJ, "não leveis nada pelo caminho nem sapatos, nem mochila", nem aguaios, mantas e ponches (Mt 10, 10); " sede simples como as pombas "(Mt 10,16).

Assessores da PJ, "sede espertos como as serpentes, porque eis que eu vos envio como ovelhas entre lobos" (Mt 10,16). Assessores da PJ, para enfrentar o lobo voraz do neoliberalismo, com todas as conseqüências que traz para os jovens e o mundo juvenil é preciso "ser simples", mas é preciso ao mesmo tempo, "ser espertos" (Mt l0,16).

Sim, a assessoria sábia deve aliar simplicidade e audácia, fé e competência, espiritualidade e planejamento na sua paixão pelos jovens e pela mudança.
Com estes elementos acredito que é real o sonho que está por trás desta frase que é a síntese da missão da Pastoral da Juventude e da Assessoria na PJ: "o jovem que pensa, se organiza e age"

Para refletir:

1. Depois de ler este livro, e em especial este último capítulo, para você, o que é Pastoral da Juventude?
2. Qual a missão da assessoria na PJ?

Para pensar:

O jovem que pensa, se organiza e age!
Pe. Vilsom 

 

CONCLUSÃO
Depois de toda esta reflexão deixo para você um texto bíblico: Êxodo 18, 1-27. Não trago a figura de Moisés, como normalmente se costuma fazer. Moisés é um aprendiz neste texto. Trago sim a figura de Jetro, seu sogro, uma pessoa que nos ensina muito.
Convido-o agora a tomar a Bíblia, abri-la no livro do Êxodo e ler o capítulo 18. Leia, pelo menos, duas vezes. Depois de ler responda a pergunta:
Que lições concretas Jetro nos ensina? Escreva, agora numa folha as lições que Jetro nos dá.


Agora que já fez o exercício, partilho com você as 1ições que aprendi lendo este texto:
Jetro é o símbolo de como deve ser o assessor da Pastoral da Juventude:
a.  valorizar a sua família e a família do jovem - o afetivo: versículos 2.5.6.7;
b.  estar em movimento, buscando sempre, ser imigrante, não se acomodar pensando que sabe tudo: v. 3;
c.  ser uma pessoa de profunda espiritualidade, ser Eliezer: v. 4. 10. 11;
d.  provocar o diálogo, a partilha e revisão de vida: v. 8.9;
e.  dar importância à festa, à alegria, ao banquete, à gratuidade: v. 12;
f.  observar a vida e a realidade das pessoas: v. 13.14;
g.  refletir e propor alternativas concretas e novas: v. 14 a 21;
h.  formar lideranças: v. 20;
i.  favorecer espaços de liderança e protagonismo: v. 21.22;
j.  buscar o bem da pessoa do assessor e dos jovens: v. 23;
k.  acompanhar o crescimento da PJ e das pessoas: v. 24 a 26;
l.  ter seu espaço pessoal e próprio, seu caminho de crescimento e formação: v. 27.

Com os elementos que descobri e que pus no papel, junte os que você pôs na folha; leia o texto outra vez, com calma, e verá que descobrirá vários outros. Confesso-lhe que este é um dos textos que mais leio para me inspirar em como deve ser a assessoria na Pastoral da Juventude.
A presença de Jetro junto a Moisés teve como objetivo maior devolver-lhe serenidade. refazê-lo afetiva, espiritual e organizativamente - A PAIXÃO e tornar possível a missão de conduzir o povo à Terra Prometida - A MUDANÇA.
Terminando este livro, desejo que seu serviço de ASSESSORIA NA PASTORAL DA JUVENTUDE seja marcado pela PAIXÃO e pela MUDANÇA.


Assessoria na Pastoral da Juventude

Nenhum comentário:

Postar um comentário